VENDO O MUNDO DOUTRA PERSPECTIVA
Jorge Luis Borges certa feita havia dito que para
entendermos um único livro seria preciso termos lido muitíssimos livros. Putz!
Aí lascou tudo.
Não é bem assim. O referido escritor argentino está
apenas nos chamando atenção para o fato de que a leitura, por sua natureza,
depende fundamentalmente da nossa capacidade imagética e mnemônica, que ela se
sustenta em nossa imaginação e memória.
Nesse sentido, quanto mais livros lemos, mais amplo é
nosso universo de referências e mais rica torna-se nossa imaginação o que, por
sua deixa, nos permite compreender com mais profundidade e acuidade as
referências, menções e alusões que o autor duma determinada obra está nos
apresentando por meio de suas linhas.
Trocando por miúdos: se nosso imaginário for rico e
nosso mundo de referências for vasto, maior será o cabedal de ferramentas que
teremos em nossas mãos para visualizar aquilo que o escritor estará nos
apresentado e, dessa maneira, nos auxiliando significativamente para podermos
dizer, para nós mesmos, que entendemos o que o autor está procurando nos dizer
e não apenas declarar, preguiçosamente, aquilo que nós achamos que ele supostamente
nos disse.
No primeiro caso, nós vamos ampliando nosso horizonte
de compreensão conforme nos impregnamos com as imagens, referências, alusões,
menções e percepções da realidade que são gentilmente apresentadas pelo autor
através de sua obra.
No segundo caso, mantemo-nos fechados em copas, em
nosso mundinho que toma como referência magna nossa miséria imaginativa e
memorativa.
Nesse sentido, muito daquilo que nós chamaríamos de
nossa “análise de discursos”, de nossa “interpretação”, na maioria dos casos
pode muito bem ser apenas uma projeção de nossa subjetividade miúda sobre a
complexidade da realidade apresentada pela obra lida, encobrindo-a e, sem
querer querendo, limitando drasticamente nossa capacidade de compreensão,
entendimento e esclarecimento.
Pior! Teremos a ilusão de que essa gambiarra
cognitiva realizada por nós seria a fina flor da criticidade e, dessa forma, ao
invés de termos uma ampliação de nosso horizonte de consciência, teremos tão
somente uma restrição drástica do mesmo, aja vista que consideramos nossa
limitação à expressão da amplitude do saber.
Sim, isso é triste, mas é mais ou menos desse modo
que a banda toca.
Parêntese: pessoalmente acho realmente incrível que
uma pessoa que não se esforçou pra compreender o que um autor escreveu,
acredite, sinceramente, que o que ela supostamente interpretou [sem nada
compreender] seja uma visão superior e mais verdadeira do que aquilo que o
escritor procurou comunicar com suas palavras e ele, um “leitor crítico”, não
se esforçou, nem minimamente, para compreender. Resumindo: o caboclo tem que
ser muito aluado para imaginar que invencionice crítica seria a mesmíssima
coisa que esclarecimento. Fecha parêntese.
Enfim, é isso o que temos; é mais ou menos assim que
nos perdemos, que estamos a nos perder, em nós mesmos sem nos darmos conta da
encrenca toda.
Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela,
em 02 de maio de 2019.
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