QUANDO O POTE DE MEL VIROU



A prática duma arte não é possível sem a devida e indispensável disciplina.

Todo bom músico sabe que deve dedicar-se há inúmeras horas diárias de prática; prática repetitiva, cansativa, maçante e aparentemente desconexa, mas que, ao final dum extenuante labor, lá está a obra, pronta e acabada.

Detalhe importante: quanto mais o indivíduo pratica, quanto mais ele repete aquelas sequencias de exercícios, mais refinada torna-se o produto final porque, devido a isso, ele saberá todos os movimentos de cor e salteado. Saberá de coração tudo aquilo e muito mais.

E de tanto repetir as formas cristalizadas e consagradas pelo tempo, mais autônomo e singular ele - enquanto indivíduo - acaba se tornando.

E, com o tal do tempo, vai criando aquilo que convencionamos chamar de estilo.

O mesmo vale para a pintura, para as artes marciais, para a escultura, para a culinária, marcenaria, andar de bicicleta, enfim, tal regra é válida para todas as atividades humanas que tem por intento realizar um reto fazer com vistas a atingir uma determinada perfeição, como nos ensina Hugo de São Vitor.


Regra essa que, por sua deixa, acabou por ser desdenhada pelo sistema educacional; sistema esse que prima pela bajulação de infantes mimados por genitores desleixados em detrimento do intento abnegado de educar as tenras gerações, para guia-los pra fora de seu mundinho pueril rumo a maturidade.

Repetir a realização de algo denota a intenção, insistente e persistente, de integrar essa ou aquela arte em nossa personalidade, de tal forma que essa venha a se tornar espontânea, de modo similar a andar de bicicleta.

Após inúmeros tombos e esfolados nos joelhos, nós aprendemos a pilotar a magrela e nunca mais esquecemos. Nós não ficamos titubeando sobre o que fazer para rodar com ela; nós simplesmente fazemos do nosso jeito, ao nosso estilo, graças as persistentes repetições.

Infelizmente, como já havíamos dito, tal regra, foi banida do vocabulário pedagógico contemporâneo. É, inclusive, vista como sendo um anátema entre as mentes “bem pensantes” e devidamente “diplomadas”.

O preço disso, todos nós bem conhecemos, aja vista que o analfabetismo funcional viceja entre nós e, em grande medida, em nós (tendo em vista que um analfabeto funcional não sabe que o é e, obviamente, dificilmente se reconhecerá como um).

Por fim, feliz era o tempo, como disse recentemente o escritor Percival Puggina, quando a professora normalista, sem ter tido o contato com os psicologismos e pedagogismo hodiernos, liberta de entreves burocráticos mil, alfabetizava crianças às pencas em aproximadamente seis meses.

Ele, Puggina, foi uma dessas crianças; hoje ele é um rapagão de 74 aninhos.

Infelizmente, continuamos insistindo em seguir pela vereda do fracasso, consagrado pelos devotos do padroeiro do pau oco de nossa tragédia educacional, como se já não fosse suficiente o drama que atualmente vivemos.

Agora chega. Agora nos entreguemos aos prazeres do café.

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela, em 15 de abril de 2019. Natalício de Leonardo Da Vinvi e de Émile Durkheim.

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