UMA HISTÓRIA SEM FIM
A imaginação é a base de tudo. Tudo
o que fazermos, tudo aquilo que nós realizamos, necessariamente passa pelo
crivo do nosso imaginário. Não tem lesco-lesco. Não tem mesmo.
Se nós não somos capazes de imaginar
algo, não temos meios para refletir e compreender esse algo. É bem desse jeitão.
Certa feita, uma amiga, professora
de bioquímica, contava-me que após ter ministrado uma aula, de ter feito aquela
explicação "top", viu um aluno levantar a mão para lhe fazer uma pergunta, a
qual seria a seguinte: “professora, a senhora realmente acredita que tudo isso
que a senhora disse existe?”
Pois é. O rapaz estava cheio de boa
vontade e, inclusive, podemos dizer que sua curiosidade era bem perspicaz, todavia,
ele não era capaz de imaginar tudo aquilo que a sua gentil professora descreveu
e explicou e, se não somos capazes de imaginar o que nos é descrito, não temos
como compreender o trem que nos é apresentado.
Por isso que Albert Einstein afirmava
que a imaginação é imensamente mais importante que a razão. Todo o material que
nossa faculdade racional utiliza para matutar é necessariamente colhido nos
jardins, ou nos pântanos, de nosso mundo interior, composto por uma multitude de
imagens e fantasias.
Por isso é tão importante alimentarmos
bem o nosso imaginário. Melhor. É por essa razão que devemos treinar a nossa imaginação.
Isso é algo imprescindível para sermos capazes de conceber, interiormente, a
maior quantidade possível de cenários, principalmente quando somos confrontados
com um dado ou com uma situação inusitada.
É importante lembrarmos – e, se
possível, jamais esquecermos – que o nosso imaginário não é uma caixa estanque,
pronta e acabada. Muito pelo contrário. Ele é continuamente criado, recriado e
ampliado – ou reduzido e mutilado - a partir das novas imagens que nos são
atiradas pelo mundo exterior que são apropriadas e trabalhadas pela nossa
memória.
Isso mesmo. Aristóteles nos ensina
que a imaginação e a memória são o verso e o reverso da mesma moeda. E hoje,
mais do que nunca, nós sabemos que é assim mesmo que a banda – memorativa/imaginativa
- toca.
Essas imagens que habitam nossa
memória e imaginação, ao mesmo tempo que têm as suas formas influenciadas pelo
mundo exterior, também acabam por atuar sobre a maneira como concebemos e
compreendemos a realidade concreta presente em nosso em torno, fomentando, como
direi, mutações sobre o nosso modo de agir e de compreender o mundo,
incorporando novas questões que nos são postas aqui e acolá.
Essas novas questões podem ser
fruto duma reflexão devidamente ordenada e serena se nossa imaginação for apropriadamente
treinada e educada e, é claro, bem alimentada.
Agora, se essa é simplesmente largada
a esmo, recebendo toda ordem de imagens e fantasmagorias cuja procedência nós
não fazemos a menor ideia, sem querer querendo, por meio de nossa imaginação
deseducada, corremos o risco de ser utilizados, manipulados, sem nos darmos conta
disso. E, ainda por cima, é bem possível que creiamos que estamos fazendo a
coisa certa, agindo criticamente para o bem comum porque, infelizmente, não estaremos,
nesse caso, sendo capazes de, imaginativamente, conceber uma possibilidade diferente.
Por isso que em terra de cego, quem
tem um olho não é rei; é um doido varrido. Desde “A República” de Platão,
passando pelo “Admirável mundo novo” de Aldous Huxley e chegando até “A
História sem fim” de Michael Ende que a marcha da ventura e desventura humana
acaba não sendo muito diferente não. O ritmo pode até mudar, mas o riscado acaba
sendo sempre o mesmo por pura falta de imaginação e de reflexão.
Escrevinhado por Dartagnan
da Silva Zanela, em 20 de junho de 2020, dia de Santa Margarida Ebner.
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